Últimas indefectivações

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Os bons costumes da Cochinchina

"O presidente do FC Porto diz que não sabe porque foi o presidente do Benfica à Alemanha pedir desculpa. A gente explica-lhe: pedir desculpa é acto de nobreza

COM uma semana de atraso, o presidente do Benfica fez o que devia. Foi à Alemanha pedir desculpa ao presidente do Fortuna de Dusserdorf e ao presidente da Federação alemã pelo incidente entre Luisão e o árbitro Fischer.
E como o jogo não chegou ao fim, por abandono do árbitro com ou sem «comoção cerebral», como preferirem, adianta a imprensa que Luís Filipe Vieira terá ido à Alemanha também para devolver o cachet cobrado pelo Benfica pela sua presença no desgraçado jogo.
O comportamento do presidente do Benfica honra o clube, honra-o a ele, ainda que tenha demorado a seguir viagem, e honra também Luisão e todos os jogadores do Benfica porque ficaram a saber que o presidente dá a cara por eles e pede desculpa por eles quando não se comportam como lhes é, certamente, recomendado.
O mundo não é perfeito, já sabíamos. Há quem goste de cenas de empurrões aos árbitros e há até quem veja nessas práticas uma escola de sucessos. Delinquentes e gente com má formação há em todos os clubes, não é?
Depois de ir ao estrangeiro provar que o Benfica é um clube de bem e quem a delinquência não é a bandeira mais vibrante da nossa história e que a impunidade jamais será um distintivo que nos faça crer que somos melhores e mais espertos do que os demais, depois disto tudo, ainda o presidente do Benfica viajava no avião de regresso a Lisboa e já o presidente do FC Porto perorava sobre o assunto.
«Não sei porque é que foi a correr entregar o dinheiro e pedir desculpa», disse.
A imprensa publicitou o comentário do presidente do FC Porto que não mereceu maior revelância nem mais psicanálise do que mil outros já ensaiados e debitados por Pinto da Costa sobre a vida do rival. Mais do mesmo, disseram todos. Mas não é assim.
Atente-se, uma vez mais, nas palavras do presidente do FC Porto:
«Não sei porque é que foi a correr entregar o dinheiro e pedir desculpa.»
Com todo o respeito pelo FC Porto, um grande clube que, ao contrário do que se possa supor não nasceu há trinta anos e tem uma longa, bonita e honrosa história pré-Pinto da Costa, nunca o presidente do FC Porto disse nada de tão gravemente preocupante como o que afirmou a propósito da expedição à Alemanha do seu homólogo do Benfica.
Não sabe porque é que Vieira foi a correr pedir desculpas?
Não sabe porque é que Vieira foi a correr entregar o dinheiro?
Incrível, para mais tratando-se de um dirigente com muitos e muitos anos de experiência e de vida. Acreditará piamente Pinto da Costa que os actos não têm consequências? Permanece insondável o que o leva a ver as coisas por esse prisma tão ligeiro e peculiar num adulto quando até às crianças se ensina, desde a tenra idade, que os actos têm sempre consequências e que saber pedir desculpa é o primeiro passo de entrada numa vida em sociedade.
Se é verdade que Pinto da Costa não sabe porque é que Vieira foi à Alemanha pedir desculpa e devolver o dinheiro, também é verdade que qualquer escuteiro de 12 anos lhe pode explicar.
O presidente do Benfica foi pedir desculpa ao presidente da Federação alemã e ao presidente do Fortuna de Dusseldorf porque um jogador do Benfica, o capitão, sem senso nem parcimónia, derrubou um árbitro no decorrer de um amigável entre o Benfica e o Fortuna de Dusseldorf e o jogo não chegou ao fim.
O presidente do Benfica foi pedir desculpa porque para o Benfica, um grande clube que também tem uma história pré-Vieira, não é motivo de orgulho nem atirar com árbitros, nem atira-lhes com botas ou peças de fruta, nem persegui-los pelo campo fora.
E, por isso mesmo, o pedido de desculpas de Luís Filipe Vieira é mais do que justificado, ainda que tardio. Óptimo teria sido que o presidente do Benfica tivesse ido à Alemanha mesma a correr, como disse Pinto da Costa. Ou seja, logo no dia seguinte ao episódio Luisão.
O presidente do FC Porto disse também não saber porque foi o presidente do Benfica «a correr entregar o dinheiro» ao presidente do Fortuna de Dusseldorf.
Incrível, outra vez. É que entra pelos olhos dentro que cabendo ao Benfica a responsabilidade pela interrupção do jogo para que fora contratado não podia, de maneira alguma, ter veleidades de receber o cachet por inteiro. De outra maneira era vigarice. Ou não é assim?
Mas em que Cochinchina, em que mundo é que vive o senhor Pinto da Costa onde as coisas se passam de maneira tão diferente? Que mundo é esse, tão diferente dos padrões da desejável normalidade, onde, aparentemente, é impossível um dirigente pedir desculpa a quem quer que seja sem lhe caírem aos pés os galões?
Como resolveria o presidente do FC Porto o caso se o dito caso lhe dissesse respeito?
Não havia desculpas para ninguém? Não devolveria o guito?
Com um cafezinho ao árbitro é que não ia a lado nenhum, certamente.

LUÍS FILIPE VIEIRA jantou secretamente com José Eduardo Moniz e o secretismo foi tal que no dia seguinte havia fotografias nos jornais. Há três anos, a hipótese de uma candidatura de José Eduardo Moniz suscitou grande e efémero entusiasmo entre alguns benfiquistas decididamente menos afectos à obra do presidente em exercício. A coisa pôs-se até feia entre Vieira e Moniz e não foram nada suaves as acusações trocadas entre os dois na altura.
Tudo isso, espera-se, deve ter sido ultrapassado neste jantar secreto de terça-feira porque é precisamente para isso que o secretismo também serve. Para as conciliações em público serem em voz baixa. E como são os dois benfiquistas decerto que pediram desculpa um ao outro, como mandam as boas regras de conduta.
E pronto. Está resolvido o assunto, vai uma aposta? José Eduardo Moniz não se candidatará contra Vieira em Outubro. Mas o progresso não fica por aqui. Com um bocado de jeito, Moniz ainda vai a votos, mas na lista de Luís Filipe Vieira, num cargo que possa ser considerado como um desafio irrecusável por qualquer escuteiro de 12 anos.
A situação não deixaria de ser curiosa sobretudo porque muitos benfiquistas acreditam que o próximo triénio será o do tão anunciado combate final contra Joaquim Oliveira e a sua Olivedesportos. E, nesse combate específico, a peça Moniz estava a fazer muita falta. Ou não estava? A seu tempo se verá.

NINGUÉM foi a jogo com a Sport TV e a estação de Joaquim Oliveira vai transmitir todos os jogos do Campeonato Nacional em sinal fechado. É assim que se apresenta a situação no arranque da temporada. Futebol na televisão é a pagar. A não ser que venha por aí um ministro plenipotenciário que obrigue a RTP a gastar os seus últimos milhões e a dar uma mãozinha à Sport TV na despesa. Chama-se a isto dividir o bem pelas aldeias. O importante é o serviço público. E trocos são trocos. No mundo da bola não há cá troikas a mandar na gente.

PRIMEIRA jornada completa com um número imenso de empates. Não houve grandes casos de arbitragens, o que se saúda. Só no jogo da Luz entre o Benfica e o Braga é que um árbitro conseguiu estragar o panorama geral invalidando um golo limpo ao Benfica e expulsando indevidamente um jogador do Braga. Como estas coisas sempre acontecem e tocam a todos, não vamos entrar em desatinos com o assunto. Espera-se apenas que a próxima má arbitragem não calhe outra vez ao Benfica. É só confiar nas estatísticas e na sorte. Felizmente que ninguém responsável do Benfica se pôs a criticar o árbitro e o sistema. Grande fair-play porque aquele golinho valia mais 2 pontos. Mas ninguém atirou com o árbitro ao chão. Nem ninguém se zangou com o pobre do Melgarejo. Não houve escândalo na Luz, ainda bem. Assim sendo, ficou só e desacompanhado o único escândalo da primeira jornada, lamentavelmente e dissecado até ao pormenor nos dias seguintes por eminentes teóricos. O escândalo foi este: o Gil Vicente, imagine-se, jogou todo fechado com o FC Porto e, assim, obviamente, não facilitou nem um bocadinho a missão dos campeões nacionais. E no fim nem sequer pediram desculpa."

Leonor Pinhão, in A Bola

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