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quinta-feira, 5 de junho de 2014

No país da inflamação do tendão rotuliano

"São muito diferentes Eriksson e Jesus em feitio, personalidade, imagem e oratória. Acrescente-se que Jorge Jesus, no caso que mete o Benfica, seja bem mais esperto que o sueco.

ERIKSSON, cujo valor de mercado caiu com estrondo nos últimos anos, não se cansa de lamentar, em múltiplas entrevistas e até na sua autobiografia, o facto de não ter correspondido ao convite de Luís Filipe Vieira e de Rui Costa para, em 2008, voltar a treinar o Benfica quando já estava de malas aviadas do Manchester City por indecente e má figura.
No fim do mês passado, voltou à carga sobre o mesmo assunto o treinador sueco que veio revolucionar  futebol português no início da década de 80. Em declarações a um site da revista inglesa - FourFourTwo -, Eriksson continuou a dar asas ao seu processo de autoflagelação: «O meu grande remorso é ter recusado o cargo de treinador do Benfica depois de ter deixado o City».
O tempo, como sabemos, não volta para trás. E é precisamente disso que se queixa o sueco que, em 2008, optou por uma aventura que se revelaria desastrada com a selecção do México para, dois anos mais tarde, se meter noutra alhada, um part-time exótico com a selecção da Costa do Marfim no Mundial da África do Sul.
Depois destas infelizes incursões, o que se sabe de Eriksson é que passou pelo Leicester, que não é propriamente um colosso do futebol inglês, pelas Arábias e que, ultimamente, foi visto na grande China a treinar um clube local.
O que ninguém sabe é o que teria acontecido a Eriksson e ao Benfica se, no tal ano de 2008, o sueco tivesse mandado às malvas os simpáticos mas exigentes mexicanos e tivesse optado por regressar à Luz.
A ter acontecido assim, não teria havido a contratação do simpático e impecavelmente aprumado Quique Flores que, em termos de bom aspecto geral, deixou saudades mas que, em termos de resultados, o melhor que conseguiu foi a conquista de uma Taça da Liga, a primeira das cinco que o Benfica já transportou para o seu Museu.
Foi o flop Quique Flores que autorizou Luís Filipe Vieira, contra a opinião de muita gente da casa, a ir buscar Jorge Jesus ao Sporting de Braga para iniciar este consulado vigente já vai para a sexta temporada.
Num exercício de especulação (é também para estas actividades inocentes que o defeso serve), pode-se imaginar que dificilmente Jorge Jesus viria a ser o substituto de Eriksson caso as coisas não tivessem corrido bem ao sueco, tal como não correram a Quique, ou dando-se o caso, melhor ainda, de as coisas terem corrido tão bem ao sueco que nem haveria necessidade de o substituir.
Tudo isto para concluir que, estando tudo como está presentemente - Jesus a partir para a sexta época no Benfica e Eriksson a partir para mais uma aventura, desta feita na China - é perfeitamente aceitável o arrependimento do treinador sueco que tantos e tão bons anos passou em Portugal, onde sempre se sentiu reconhecido, estimado e confortavelmente em casa, o que até pode parecer estranho sendo ele um escandinavo na cabeça aos pés e sendo nós, portugueses, bem diferentes e, frequentemente, sem pés nem cabeça.
Não dá trabalho, portanto, comparar Eriksson com Jesus na base do feitio, da personalidade, da imagem e da oratória de cada um. Na verdade, são incomparáveis. São dois seres totalmente diferentes, ainda que me pareça que Jorge Jesus, neste caso particular que mete Benfica - o clube certo para ambos, embora nem um nem outro tenham nascido benfiquistas - seja bem mais esperto e sagaz do que Eriksson.
Em 2008 o treinador sueco trocou o certo (o Benfica) pelo incerto (a selecção mexicana) e arrependeu-se até mais não. E continua com choradeira sempre que o tema vem à baila.
Entre 2009, quando chegou à Luz e 2014, o treinador português não parou de ser seduzido pelo putativo incerto (FC Porto, Arábias, recentemente até o AC Milan e até, confessadamente, o Sporting) mas tem vindo a optar sempre pelo certo (o Benfica), onde nada lhe falta, como nada faltou a Eriksson nas suas duas passagens pelo Benfica nos anos 80 e, mais tarde, nos anos 90.
Entre estas duas figuras, a quem os benfiquistas aprenderam a chamar suas, há um ponto em comum: ambos perderam duas finais europeias pelo Benfica. Eriksson perdeu uma Taça UEFA (contra o Anderlecht) e uma Liga dos Campeões (contra o AC Milan) e Jorge Jesus perdeu duas Ligas Europas (contra o Chelsea e contra o Sevilha). Falando de títulos nacionais, Eriksson vai à frente de Jesus somas 3 campeonatos contra os 2 do treinador português.
A questão é que enquanto o sueco está na China até mais ver, o português estará na Luz também até mais ver. O presidente do Benfica ainda recentemente exibiu a sua total disponibilidade para lhe renovar o contrato por mais um, dois ou três anos. É essa a vantagem de Jorge Jesus no seu campeonato particular com Sven Goran Eriksson. Tem, se quiser, muito tempo pela frente para fazer mais e melhor do que aquilo que o sueco fez. E foi muito.
Tudo isto serve, como já se percebeu, para manifestar o meu regozijo pela continuidade de Jesus entre nós, para o cumprimentar pela excelente entrevista que concedeu à SIC Notícias, em que genuinamente parecia tudo menos um sueco, e para lhe desejar um época. Que bem as merece. E nós também.
E, com toda a franqueza, já tenho saudades de ver jogar o Benfica.

NO Benfica, nem que seja por sermos tantos, é digna de elogio a pluralidade de opiniões. Tenho escutado a muitos benfiquistas alguma incompreensão, e até mesmo revolta, pelo facto de a Benfica TV ter entre os seus naipes de comentadores residentes ou eventuais alguns antigos jogadores do Benfica que, por uma razão ou por outra, saíram a mal do clube destratando com maior ou menor intensidade o emblema e as suas gentes.
Não compreendem nem aceitam alguns desses benfiquistas que o Benfica receba de braços abertos quem hipoteticamente lhe fez mal ou o traiu. Dizem que não ter memória não é ser grande e outras coisa que tais, coisas zangadas impiedosas.
Há outras opiniões sobre o assunto entre o vastíssimo número de adeptos. Há, por exemplo, quem defenda precisamente o contrário. Que perdoar é que é ser grande.
Ainda que, se calhar muitos não o saibam, estes benfiquistas benevolentes são directamente inspirados por um teólogo romano do século IV, Tertuliano, que deixou escrito: «Se quiseres ser feliz num segundo, vinga-te; se quiseres ser feliz a vida inteira, perdoa». E não deixava Tertuliano de ter razão.
Devo confessar que, com o passar dos anos, fui-me passando do grupo dos impiedosos para o grupo do tertulianos no que diz respeito a estes casos da gloriosa porta sempre aberta para quem por ela se escapuliu. Sinal de fraqueza da minha parte, dirão. Nem vos vou contrariar. A meu ver o Benfica é muito mais do que um clube, é uma obra social, não me canso de o repetir com orgulho, sabendo até que o orgulho não é bom sentimento.
Provavelmente, à laia de justificação, assistiu-me a necessidade de partilhar estes triviais pensamentos com os leitores benfiquistas antes de lhes comunicar o seguinte: fiquei sinceramente contente por ver Paulo Sousa - sem dúvida, um dos nossos piores trânsfugas - a assinar o seu contrato de treinador com o Basileia depois de ser sagrado campeão em Israel.
Ao comando do campeão suíço, Paulo Sousa será o quinto treinador português a marcar presença na próxima edição da Liga dos Campeões (depois de Jorge Jesus, Marco Silva, Leonardo Jardim e André Villas-Boas). Digam lá se não é bonito?

DE acordo com dados da Organização Mundial de Saúde, a China enfrenta uma nova epidemia de gripe das aves, a cólera volta a atacar em Angola, no Brasil há o problema do dengue enquanto no Arkansas se sofre com a febre dos fenos. Enfim, para cada ponto do globo sua maleita.
Convirá, talvez, avisar as autoridades mundiais na matéria que Portugal passou a ser desde anteontem, por unanimidade, o país da Inflamação do Tendão Rotuliano.
Desde que a FPF, corajosamente, deu o nome à maleita que apoquenta Cristiano Ronaldo logo o anteriormente desconhecido e agora já célebre tendão rotuliano entrou no léxico, no imaginário e na corrente sanguínea dos portugueses. Se o nosso capitão tem o tendão rotuliano inflamado, todos os seus compatriotas, por contágio e por solidariedade, também querem ter.
Aliás, já há mais especialistas nacionais em problemas do tendão rotuliano do que em treçolhos."

Leonor Pinhão, in A Bola

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