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domingo, 30 de abril de 2017

Quase trezentos minutos

"O Benfica sabe que não conquistou nada e não pode haver qualquer euforia. Serão quase trezentos minutos. Onde não importa muita arte.


1. Faltam mesmo três finais para terminar a nossa Liga de futebol. E vão ser mesmo três finais. Serão quase trezentos minutos. Onde não importa muita arte. Importa total eficácia. E acrescida garra. E forte dedicação. O Benfica sabe que não conquistou nada e que não pode haver qualquer euforia. Os dois próximos jogos do Benfica serão contra duas equipas que estão a fazer um extraordinário final de prova e com jogadores que, acredito, serão bem cobiçados por grandes emblemas do futebol europeu, como o extraordinário Krovinovic do Rio Ave!
Ontem, num Estádio da Luz repleto, e com momentos de intenso fervor clubístico, o Benfica venceu um Estoril aguerrido e bem organizado. E em muitos minutos alguns recordámos a recente meia-final da Taça de Portugal. A primeira parte do encontro de ontem mostrou grandes momentos do Benfica. Com interessantes oportunidades de golo. Mas no primeiro quarto de hora da segunda parte a Luz tremeu - trememos, assumamos - com o bom jogo e as grandes oportunidades de golo da equipa de Pedro Emanuel. Aqui, neste período, o Estoril jogou bem, com uma elevada nota artística. O inferno da Luz foi, de verdade, quase invertido. Depois surgiu, num ápice, uma obra de arte - mais uma... - de Jonas. A forma como comemorou esse extraordinário golo, a sua aproximação aos adeptos evidência o sentimento que, de imediato, interiorizou e, de forma expressa, assumiu. Poderia ser um golo determinante para a manutenção não só da liderança da Liga como igualmente para a determinante conquista de mais três pontos. Foi uma vitória bem suada. E guardada. Uma vitória sofrida. E, como escreveu François Fénelon, «aqueles que nunca sofreram não sabem nada; não conhecem nem os bens nem os males; ignoram os homens; ignoram-se a si próprios!» Serão muitos minutos para sofrer. Com a consciência e a fé que vale a pena, nesta sede, sofrer!


2. Já sabemos quem sobe à Liga principal e que, assim, multiplica por dez - acredito - as suas receitas televisivas. Portimão e Aves passam a ter futebol de primeira. E o Nacional a ter cada vez mais dificuldades em manter-se na primeira o que pode levar a Madeira a perder, em duas épocas consecutivas, dois clubes na primeira divisão. Ficará só o Marítimo o que pode fazer ressuscitar, após as eleições autárquicas deste Outubro, a questão dos apoios ao futebol profissional naquela Região Autónoma. Mas Vítor Oliveira - cada vez mais o treinador das subidas de divisão o que deve implicar, e muita justamente, um prémio bem especial... - e José Mota são os dois treinadores vencedores e indiscutíveis duas velhas raposas do nosso futebol. O que é interessante é que são duas sociedades desportivas lideradas por não portugueses o que é um dado relevante na economia do futebol português. Se o Feirense é assumidamente nigeriano e se há sinais que em Vila do Conde haverá capital chinês a demandar o Rio Ave, é interessante constatar que na segunda liga há muitas sociedades desportivas que são dominadas por capital estrangeiro e, em especial por capital chinês ou brasileiro. Aqui é natural em razão da singularidade da regulamentação portuguesa que, concretizando a igualdade de direitos entre portugueses e brasileiros, é aquela que possibilita a maior - e diria melhor... - exposição do jogador brasileiro ou, em consequência daquela igualdade, de outras nacionalidades numa liga de futebol do espaço europeu. Mas, neste tempo em que a violência associada ao futebol prende a atenção mediática, é muito importante que a nossa Liga identifique situações singulares como aquelas que resultam de susceptibilidade de titulares dominantes de sociedades desportivas serem, ao mesmo tempo, empresários legítimos de jogadores que integram outras sociedades participantes nas mesmas competições profissionais. O futebol português, muito preocupado com mais disciplina ou com vídeoárbitro para tudo, tem de identificar as especificidades que possibilitam realidades únicas nas suas competições. Como mais transparência societária. E nestes momentos em que, de repente, a formação arrepia algumas colunas e fomenta múltiplos colóquios, seminários e acções, talvez seja útil que alguns passem os olhos por um interessante livro de um Prémio Nobel da Economia, Daniel Kahnemann - 'Pensar, Depressa e Devagar' - que nos adverte, por exemplo, que «na condução das nossas vidas, permitimo-nos normalmente ser guiados por impressões e sentimentos, e a confiança que temos nas nossas crenças e preferências intuitivas é, em geral, justificada. Mas nem sempre. Muitas vezes estamos confiantes, mesmo quando estamos errados, e um observador objectivo é mais capaz de detectar os nossos erros que nós próprios»! Bem verdade, acreditemos!

3. Sabemos que o clima de disputa verbal no exterior dos relvados tem atingido patamares nunca atingidos. Digo com a consciência que já vivi, até enquanto titular de órgão de justiça federativo ou como Presidente do então Conselho Superior do Desporto, momentos de elevada tensão verbal e de disputas intensas com diferentes entidades da sociedade. Disputas com o Estado, com autarquias, com adversários, com inimigos ditos desconhecidos. Mas, agora, e em razão de necessidades de comunicação - de significantes perdas de vendas de jornais a necessárias disputas de audiências televisivas - o patamar da disputa atinge níveis impressionantes. Até em razão da dimensão crescente das redes sociais e da concorrência que os seus conteúdos suscitam em termos de... notícias e comentários! Escutamos repetições consecutivas das mesmas declarações. Depois as reacções às declarações. Depois a réplica. Depois a tréplica. Quase que repercutindo as novas regras do Processo Penal. E depois, de forma singular, até escutamos, em profundidade, a análise de uma grande penalidade na área errada... Perante este ambiente permitam-me um cumprimento especial a este jornal - e à sua televisão -pelas opções feitas.
A promoção do futebol jogado e dos seus protagonistas. Sabemos com Alfred de Musset que «há dois poderosos destruidores: o tempo e a adversidade». E com Benjamim Franklin aprendemos que «a discórdia almoça com a abundância; janta com a pobreza, ceia com a miséria e dorme com a morte»! E este grande político norte-americano viveu, recordo, no século dezoito. Na terra onde nasce há bem pouco tempo o Facebook!"

Fernando Seara, in A Bola

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